Prezado amigo,

Ontem havia falta de informação escrita. A história era passada oralmente, como em várias etnias que existiram e hoje ainda existem. O que não era passado oralmente era a própria experiência que orientava e todos eram críveis e as rodas eram poucas e de camaradagem. A porrada comia sim, mas nada de covardia nem excesso de testosterona.

Hoje o que atrapalha é o excesso de informação, na maioria errada, para beneficiar seus relatores, através deste veículo poderoso que é a internet. Quanto mais a capoeira cresce, mais está sujeita a essas deformações, bizarrices mesmo.

O pior que acontecia eram os "mestres de aeroporto" que saiam daqui alunos e pousavam em outras terras "mestres".

Hoje todos querem tirar proveito e gozar com "p" alheia. Infelizmente a rapaziada mais nova compra o que está à venda, ou seja, para eles, tudo que sai na net é verdade. Não tem como eles filtrarem a não ser aqueles que inteligentemente, procuram beber nas fontes ainda existentes. O que podemos fazer é informar a quem quiser nossos testemunhos, com veracidade, daquilo que acompanhamos e recebemos como herança.

Infelizmente, o ego é uma doença que não tem cura. Mas que se pode combater com trabalhos sérios e testemunhos verdadeiros.

Ainda irão aparecer muitas graduações que ainda não inventaram. Antes não existia a figura do "grupo" existia sim, a figura do "mestre". Os grupos hoje estão fechados em si próprios, com regras, graduações e verdades deles mesmos, muitas vezes inventadas e orientadas para seu próprio mundo.

“Salvo poucas exceções, as quais parabenizo” mataram os mestres. Você é aluno do grupo e não do mestre. A coisa hoje é capitalista e cada um faz o que pode pra ganhar, sem se importar com verdades e fundamentos ou ética.

A capoeira hoje inchou. Um milhão de rodas, dois milhões de eventos, vinte academias em uma única rua e o que é pior, cada uma com suas próprias regras e "mestres", que sabemos, são autodidatas da internet ou simplesmente autograduados com a aquiescência e bênçãos de alguns mestres antigos que para dizerem que tem muitos mestres formados, e continuarem em evidência, estão fazendo um monte de merda por ai.

Muitos até nem são mestres. São pessoas que praticaram a capoeira na juventude, pararam mil anos e agora aproveitando a "onda" se dizem mestres antigos, sem nem terem chegado a instrutores no seu tempo, “o que me deixa mais triste”.

Nós sofremos por ter pudor, ética, moral e ter presenciado o que era e no que se transformou nossa arte. Somos cria da verdade, testemunhas da transição e agora observadores da ganância, egocentrismo e do imediatismo de se chegar a mestre sem um mínimo de conhecimento do que quer dizer essa palavra.

Muitos não sabem que às vezes é melhor um curso técnico bem aprendido e rápida colocação no mercado de trabalho do que um título superior comprado ou mal feito. Quem faz o profissional é o próprio profissional com seus saberes e experiência de fato aprendida. Não é um diploma que te faz profissional e sim como você executa o que se propõe a fazer.

Um pão feito com fermento é diferente de outro feito com bromato. Ambos são pães, mas as diferenças são gritantes quando você prova. Agora, cabe a você decidir que pão comer!

Realmente, ninguém é dono da verdade. A verdade pode ser manipulada, mas mesmo assim, a verdade existe e está lá pra você beber. É só procurar nas fontes certas.

Ontem a verdade estava com os anciões e todos eram consultados, ouvidos e respeitados. Hoje não tem o mesmo valor. São muitas vezes usados para autopromoção de certos indivíduos e expostos como troféu decorativo e não consultivo.

Cabeça branca era respeito, conhecimento e espelho. Hoje com a ânsia e ganância, pintam o cabelo de branco para enganar os mais jovens e muitos são tão jovens que o branco de seus cabelos não engana ninguém.

Ontem também tinha o que não prestava, mas eram mais facilmente detectados, mas hoje a coisa degringolou pelo inchaço sofrido pela capoeira. Por tanto te digo: continue seu trabalho, pois você pode até não perceber, mas está sendo observado e servindo de espelho.

Procure selecionar, sem agredir ninguém, dessa forma a verdadeira capoeira viverá para sempre em sua essência, apesar das incongruências e despautérios que ora se apresentam. No final, todos que amam a capoeira, sejam antigos ou neófitos, saberão onde procurar os bons redutos de nossa arte.

Fique em paz. Deus abençoe a todos.

Paulo Roberto Lopes
Mestre Paulinho Meia Lua